Helio FERVENZA

 

Helio FERVENZA est né en 1963 à Sant'Ana do Livramento, Brésil. Il vit et travaille à Porto Alegre.

http://www.ufrgs.br/artes/arquipelago

 

 

Image d'un travail realisé pour l'exposition "Contato" dans le "Castelinho do Flamengo" à Rio de Janeiro. Titre: "Empreendimento: Ponto de Impacto: Perda de Contato", off-set sur papier (maquette electronique: Glaucis de Morais, à partir d'une photographie de Andrea da Costa Braga), 15 x 15 cm, 2004.© Fervenza

 

 

Moebius © Fervenza

 

 

Doctorat d’Arts Plastiques à l'Université de Paris I Panthéon-Sorbonne, 1995. Professeur à l'Institut des Arts de l'Université Federale du Rio Grande do Sul / UFRGS à Porto Alegre, et enseignant-chercheur au CNPq, Brésil. Sa pratique artistique explore plusieurs médiums, où les notions de présentation ou de vide sont récurrentes. Il participe régulièrement à des expositions personnelles et collectives au Brésil et dans divers pays d’Amérique du Sud, ainsi qu'en Europe depuis 1983. Dans le cadre du programme FPES - Perdidos no Espaço et du Projeto Areal, il a proposé et développe une série de projets artistiques divers.
Auteur du livre O + é deserto, Escrituras Editora, São Paulo, 2003.

Trois principaux centres d'intérêt sont développés dans son travail artistique : Les possibles 'inscriptions' dans un espace, fait d'interruptions, d'intervalles et de vides, au moyen de signes et de notions relatives à la ponctuation.
La prise en compte de certaines données présentes dans un contexte et des espaces architectoniques, culturels, économiques, sociaux ou symboliques, mises en relation avec la présentation formelle d'une oeuvre, comme éléments constitutifs des propositions artistiques produites.
L'investigation sur les processus de présentation, en rapport avec la notion d'art.


Furtiva Transparência

‘ Escrevi este texto instigado pelas perguntas formuladas pela artista gaúcha Cláudia Zanatta, numa conversa que tivemos através de e-mails. Este diálogo não é definitivo e gostaria de, num futuro próximo, publicar o texto integral dessas interlocuções.
As perguntas de Cláudia foram suscitadas por uma intervenção que realizei no início deste ano e que se chamou “Furtivo (o mito produz desertos)”.
A intervenção constituiu-se de um número ilimitado de adesivos em vinil (11 x 8 cm), produzidos a partir da silhueta do avião de combate norte-americano F-117. Os adesivos são transparentes, de maneira a integrar-se com a superfície dos lugares onde forem colocados, tornando-se minimamente perceptíveis. Inicialmente, eles estavam previstos para serem inscritos e disseminados em muitos pontos no campus central da UFRGS durante o evento “Perdidos no Espaço”, o qual integrava o III Fórum Social Mundial, realizado em Porto Alegre em 2003. Mas, na medida em que a proposta foi sendo realizada, ocorreram descobertas e alterações. Os adesivos foram colocados única e finalmente sobre os monitores dos caixas bancários de distribuição automática presentes dentro do Campus.
Esta opção deve-se a motivos que se inter-relacionam.
O primeiro é mais circunstancial. Ele relaciona aspectos militares ¾ o F-117 é um avião de combate ¾ e financeiros e a inserção dessa relação em nosso cotidiano na véspera do que foi a guerra do Iraque.
O segundo motivo tem a ver com as características materiais dos recortes produzidos para realizar as interferências. Os adesivos feitos a partir da silhueta do Furtivo são transparentes e confundem-se com a superfície sobre a qual se inscrevem. Eles, de uma certa forma, desaparecem. Isso tem a ver com o F-117, um avião que é dificilmente detectável. É como se ele fosse invisível. Além do mais, a transparência esvazia, por assim dizer, o design inusitado e característico desse avião. A forma está lá, mas é como se ela estivesse vazia.
O adesivo do “Furtivo” que realizei tornou-se invisível pela transparência. Essa transparência foi o que me atraiu ¾ depois de ter experimentado um pouco aleatoriamente sobre muros e paredes ¾ para as portas, janelas, vitrines e divisórias em vidro existentes no Campus. Quer dizer, interessou-me esta característica que possuem algumas superfícies de deixar passar nosso olhar e transparecer o que está além delas. O que está do outro lado dessas superfícies pode mudar ou ser trocado sem afetar sua constituição. Mas elas também nos confundem, por mostrar-se invisíveis. Superfícies envidraçadas podem ser barreiras para o nosso corpo e imperceptíveis ao nosso olhar.
Caixas automáticos são parte constituinte, hoje em dia, do mobiliário urbano de nossas cidades e pontos de conexão de uma imensa rede internacional de informação e circulação de valores. Os monitores dos caixas automáticos são também em vidro e deixam transparecer não uma paisagem, mas um produto ou uma informação. Nesse sentido eles podem ser aparentados as vitrines, por exemplo. Quando colei um dos adesivos nessa superfície, percebi que o recorte do “Furtivo” havia encontrado seu lugar e a proposta, sua definição. Dava-se o encontro de dois elementos bastante carregados simbólica e ideologicamente, mas sem redundância de visibilidades e problematizando sua constituição. Esse esvaziamento da forma do avião pela transformação de sua silhueta numa superfície transparente chegou ao seu ponto maior de intensidade quando do contato com a superfície também transparente do monitor. Mas, estranhamente, esse ponto de maior intensidade adquiriu ressonância em termos negativos e não cumulativos. Esse encontro tornou-se esvaziamento potencializado.
Curiosamente, “Furtivo” vive à beira do desaparecimento. Assim como o avião do qual tira emprestado seu nome, o que faz sua característica é essa dificuldade em ser percebido por um certo sistema de referência e localização. Parece que é isso que ele problematiza. Nosso mundo é povoado por sistemas de signos e percepções que também ¾ ou sobretudo ¾ são sistemas de valores. Na maior parte do tempo, não vemos e não compreendemos como esses sistemas se estabelecem e se relacionam e grande parte da produção de visibilidades, devido ao seu excesso, colabora com esse estado de coisas.
Um outro aspecto que o Furtivo problematiza é sobretudo o do processo de apresentação: como e quando sabemos que algo é apresentado como arte? O que é que torna possível uma apresentação em arte? Uma concepção da arte? Uma percepção da apresentação como apresentação da arte? Uma percepção do que seja arte? Quais os limites da apresentação?’

Helio Fervenza
Agosto de 2003